sábado, 23 de maio de 2009

A Dama de Branco - Parte 1

Parte I - "Quem sabe dizer se a vida não é morte, ou se a morte não é vida? " / Eurípedes

Overdose. Simples assim. Overdose. Alguns remédios combinados, algumas pílulas. Não ia doer, pelo menos ele achava.
Botou as píluas na mão. Um copo cheio de água na outra. Bebeu.

As sirenes da ambulância faziam um barulho irritante para todos os vizinhos de Felipe Carvalho, o retardado suicida do quinto andar.
Um outro vizinho tinha passado lá para falar com ele e encontrara o corpo no chão, com pulso quase imperceptível e respiração extremamente fraca.
Ninguém sabia o que levara ele até ali. Era um rapaz fechado, com alguns poucos amigos que apareciam lá constantemente. Às vezes algumas namoradas, ou pelo menos aparentavam, apareciam ali por alguns dias, mas nunca duraram muito tempo.
Era um homem bonito, se dizia, com cabelos bem pretos e lisos, cortados de forma não muito longa.

O doutor Alexandre tentava reanimar o homem, sem nem saber seu nome.
-Alguém da família?
Perguntou o médico, com tom levemente decepcionado.
- Não - respondeu a enfermeira - não conseguimos falar com ninguém.
- Coitado deste homem. Sem família, que modo horrível de...
E não conseguiu terminar as palavras.
Depois que todas as tentativas de reanimação falharam, foi só uma questão de reparar na hora da morte e levar o corpo para o necrotério.

E ninguém sabia, que enquanto o doutor Alexandre tentava reanimar um paciente quase morto, ele passava a experiência mais estranha e bela de sua vida.
Luzes brancas, flashes amarelos e uma profunda sensação de felicidade. Ele não sabia onde estava, mas gostava de onde estava.
Subitamente se viu flutuando por cima de um rio quase nada profundo, com as margens e o fundo feitos de um material brilhante que não era nem orgânico nem inorgânico, simplesmente era. E, por seu lado, corredores saíam, sempre brilhantes, e no final de cada um deles, uma memória. Ele como uma criança pegando sua bola, logo antes de ser atacado por um cachorro cujo dono dissera ser inofensivo.
Sua mãe contando que sua avó tinha câncer, e no final do túnel, uma bela mulher, que ele não conhecia. Era simplesmente linda, perfeita.
Ela o aguardava com um sorriso sereno, que não transmitia a preocupação que ela sentia naquele momento.
- Volta - disse ela - volta e vive.
Felipe se sentiu jogado em uma piscina de águas gélidas e acordou.

Um empregado qualquer do hospital carregava um corpo para sua gaveta no necrotério, quando pensou ter sentido um movimento. Claro que assustara.
Então outro movimento.
O funcionário arriscou olhar para o corpo. E o mesmo abriu os olhos.
- Onde estou?
Perguntou Felipe Carvalho.
O funcionário saiu correndo.
Felipe levantou e saiu, mesmo nu, pelos corredores.
E então viu uma mulher no fundo do corredor do hospital, toda vestida de branco. Era simplesmente linda, perfeita.
Próximo a ela, sentiu uma sensação de paz interior, uma coisa maravilhosa.
- Quem é você? - perguntou ele - E onde eu estou?
- Você está no hospital - respondeu a bela mulher - E eu sou a sua segunda chance.
- Minha o quê?
- De forma clara: Você quase morreu e eu te salvei, te dei uma segunda chance.
- Como?
- Fiz o oposto do meu dever, te devolvendo a vida.
- Você tá dizendo que é a morte?
- Quase isso.

Nenhum comentário: